A história
dos vestidos da corte russos começa em 1834, quando vestidos à moda russa foram
introduzidos por uma ordem do imperador. Antes disso, a corte vivia na mais
completa bagunça. A moda do império francês era considerada vulgar. As caudas e
as penas da regência inglesa também não pegaram. As mulheres vestiam o que lhes
viesse à cabeça. Nicolai I, certinho e pedante, ficou de saco cheio e,
observando os oficiais vestidos todos de acordo com seu cargo e regimento,
“uniformizou” também as mulheres. A cor e o tipo de bordado era definido pela
posição daquela que usava o vestido na corte, permitindo identificar
visualmente o rank da dama, e simplificando as enrolações da etiqueta e
protocolo.
183x
O modelo do
vestido era uma mistura entre a moda da época e as roupas tradicionais russas. As
“damas do estado” e as damas de honra solteiras deveriam usar vestidos verdes
com bordados dourados. As damas da imperatriz usavam azul. As damas das
princesas, azul claro. As chefes das damas de honra, vermelho escuro. As damas
que visitavam a corte poderiam usar vestidos de qualquer cores, além das
reservadas para as damas de honra. Todas as mulheres deveriam também usar um
kokoshnik, e um véu branco de tule até o chão.
1900 Kokoshnik bem simples
Estes
vestidos eram extremamente desconfortáveis. Os corpetes eram muito justos, as
caudas eram reforçadas com várias camadas de tecido para suportar o peso dos
bordados. As mulheres referiam-se ao ato de se vestir para ir à corte como
“colocar a armadura”.
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Enquanto as
outras cortes seguiam a moda, a Rússia insistiu firmemente no modelo histórico
e, de 1834 a 1917, os vestidos diferentes das damas da corte russa eram
facilmente reconhecíveis, sendo também uma fonte de orgulho: as mulheres russas
destacavam-se nas cortes estrangeiras, e em casa impressionavam os visitantes.
Das
lembranças de uma das damas da corte acerca dos bailes na corte alemã, no
início do século 20:
E as damas russas inevitavelmente atraíam a atenção de todos com a beleza e a riqueza dos nossos trajes nacionais. Kokoshnik, véu, vestido de corte histórico ricamente bordado com longa cauda e grande número de pedras preciosas não poderiam deixar de impressionar.
1900
A primeira
mudança deste “uniforme” ocorreu na década de 40, quando o vestido de veludo
(sarafan), a peça de cima, e o vestido de cetim (caftan), a peça de baixo,
foram adaptados à moda dos espartilhos. O traje transformou-se em três peças
separadas: saia bordada de seda branca, à qual ajustava-se uma cauda presa à
cintura, e um corpete que incorporava as mangas tradicionais. A aparência do
conjunto era a mesma que o de um segundo vestido de veludo colocado sobre o
vestido de seda.
1900 Saia
1900 Observe como a saia era fixada no corpete do vestido.
Inicialmente,
os kokoshniks das mulheres da família imperial eram de veludo, decorados com
pedras preciosas, enquanto os das suas damas eram enfeitados com pérolas. No
final do século 19, contudo, a maior parte da família imperial deixou de lado
este estilo, optando por tiaras que tinham o formato de um kokoshnik. Estes
belos trabalhos de Faberge e Bolin eram obras primas da joalheria russa, e
entraram na moda também no resto da Europa. Alias, algumas tiaras neste estilo
estão entre os tesouros da coroa britânica.
Grã Duquesa Maria, filha de Nicolai II, usando um kokoshnik simples com pérolas.
Imperatriz Alexandra usando uma tiara em forma de kokoshnik.
No final do
século 19 e início do século 20, os vestidos eram feitos de cetim branco, com
cauda de veludo, bordada em ouro. Na parte direita do corpete, fixava-se o
símbolo correspondente a sua posição (monogramas da pessoa da família imperial
a quem serviam em pedras preciosas, sinal distintivo de uma dama de honra) ou
um retrato (elevada distinção, pois as “damas do retrato” tinham uma posição
superior na hierarquia da corte). A cor das pedras deveria corresponder à cor
do vestido.
Vestidos da corte das grãs duquesas Olga e Tatiana, filhas do último imperador russo.
Olga e Tatiana
Os vestidos
de tecido de ouro eram reservados à Imperatriz, e os de tecido de prata, para
as filhas do Imperador. Quando a Imperatriz vestia ouro, as Grãs Duquesas
poderiam vestir prata. Contudo, todas as Imperatrizes preferiam prata, por ser
mais leve, de modo que as suas filhas raramente tinham oportunidade de usá-lo,
fora nos seus casamentos, quando este era obrigatório. Nas demais ocasiões,
elas usavam vestidos de veludo da cor de sua preferência, que ficava reservada
para seu uso exclusivo.
Vestido usado pela imperatriz Maria Feodorovna em 1883, na coroação.
Eram,
obviamente, absurdamente caros. Por exemplo, o vestido da princesa Yusupova,
encomendado em 1885, custou 1500 rublos (o mesmo preço do Ovo Imperial de
Faberge de 1888). Os vestidos levavam de 6 a 8 meses para serem confeccionados,
por isso, as lojas muitas vezes encomendavam as partes bordadas das mangas,
cauda e corpete com antecedência. As mulheres chegavam à loja e escolhiam as
peças que se adequassem ao seu gosto, posição e bolso, e o vestido era então
montado e ajustado.
Detalhe do bordado
O direito
de produzir vestidos da corte era controlado e, no século 20, limitava-se a
três costureiros (obviamente, a família imperial tinha as suas exceções, como,
por exemplo, Lamanova, que produziu vários vestidos da corte para Maria
Feodorovna).
Vestido da imperatriz Maria Feodorovna, feito por Lamanova
Olga
Nikolaevna Bulbenkova (1835-1918)
Conhecida
como “Madame Olga”, fundou uma oficina de roupas em S. Petersburgo na metade do
século 19, oficina esta que sobreviveu até 1917. Os bordados em ouro e prata
eram feitos para madame Olga por oficinas de Vasiliev. Já os vestidos da
família imperial eram bordados no convento de Novotikhvinsky, que se
especializou neste tipo de trabalho.
Izembard
Chanceau
Proprietário
de uma oficina em S. Petersburgo. Diferentemente dos bordados de ouro da madame
Olga, sua marca registrada eram as lantejoulas.
Vestido por Chanceau. Observe a difereça no acabamento.
Ivanova
Costureira
de S. Petersburgo que também tinha licença para confeccionar vestidos da corte
para clientes privadas no início do século 20. Era também bastante popular e,
junto com sua rival Lamanova, sobreviveu à revolução e se tornou designer de
roupas para teatro e cinema.