Aos sete anos, a mãe era uma senhora de sociedade pronta: poderia receber visitas e manter uma conversa. Uma vez, um certo embaixador fez uma visita a avo, mas aquela mandou a filha, uma criança, recebê-lo. A mãe se esforçou ao máximo, oferecia chá, doces, cigarros. Mas tudo em vão! O embaixador esperava a dona da casa, e nem mesmo olhava para a pobre menina. A mãe esgotou tudo o que sabia, e já estava quase se desesperando, quando subitamente teve uma idéia brilhante, e disse ao embaixador: "O senhor não gostaria de fazer xixi?" O gelo foi quebrado. A avo, ao entrar na sala, viu que o visitante estava rindo como um louco".
Felix
Yusupov, sobre a mãe.
Os
príncipes Yusupov, descendentes de Yusuf, um Khan tártaro que se aliou aos
russos e cujo bisneto Abdul-Murza se converteu ao cristianismo, e passou a ser
Dmitri, príncipe Yusupov. Nos séculos 18 e 19, a família era conhecida por sua
imensa riqueza, filantropia e coleções de arte.
Diz a lenda
que, quando os tártaros souberam da aliança de Yusuf, uma bruxa amaldiçoou a
sua família, de acordo com o qual, de todos os filhos que tiverem, somente um
viverá até os vinte e seis anos, até que a casa se extinguia. A maldição
cumpria-se, mas em nada afetava a riqueza e o prestígio da família: os Yusupov
eram quase tão ricos quanto a família imperial russa.
De todos os
Yusupov, somente uma conseguiu, em parte, escapar à maldição. Zinaida
Naryshkina casou-se com Boris Yusupov bem jovem. Deu a luz um filho, e um ano
depois, uma filha, que morreu no parto. Somente então ela soube sobre a
maldição da família.
Sendo uma
mulher decidida, declarou ao marido que não pretendia "parir
cadáveres", mas se aquele quiser divertir se, que vá procurar em outra
parte, ela não vai fazer escândalo. Isso durou até 1849, quando Boris faleceu.
Zinaida não tinha nem quarenta anos, e foi à farra. Seus amores tornaram-se
lendários, mas o mais escandaloso dos seus romances foi com um jovem
anarquista. A princesa deixou a corte para viver numa casa com vista para o
forte onde seu amado estava aprisionado. Depois, tudo acabou, e a princesa
casou-se com um nobre francês, e passou a ser condessa de Chauveau. O
anarquista foi lembrado somente depois da Revolução Russa. Em busca dos
tesouros da família, os bolcheviques derrubaram a parede de um dormitório do
palácio dos Yusupov em São Petersburgo. No quarto secreto, não acharam tesouro
algum, mas somente um caixão com o cadáver embalsamado de um homem.
O filho de
Zinaida teve, por sua vez, três filhos. O primogênito morreu na infância.
Contudo as filhas cresciam, bonitas e alegres, até que em 1878, a mais velha,
chamada de Zinaida em homenagem a avo, adoeceu. Estava à beira da morte, e a
família já se preparava para o pior, mas subitamente começou a melhorar.
Alguns
meses mais tarde, a irmã mais nova morreu de tifo.
Depois
disso, o pai tornou-se insistente no que diz respeito ao casamento de Zinaida.
Já fraco de saúde, temia não ver os netos. Zinaida, a mais bela de toda a corte
russa do final do século 19, que ate então dispensava todos os pretendentes,
decidida a se casar por amor, gostava do pai, e concordou em conhecer o perecei
de Battenberg. Este estava acompanhado pelo oficial Felix Elston, que deveria
apresentar o príncipe à futura noiva. Zinaida deu um fora no príncipe e aceitou
o oficial, que pediu a mão dela um dia depois do seu encontro.
Eles se
casaram em 1882, e Felix assumiu o título de príncipe Yusupov.
Um ano mais
tarde, nasceu o seu primeiro filho, Nikolai. Em 1886, grávida do segundo filho,
Zinaida perguntou ao menino o que ele gostaria de ganhar no natal e assustou-se
ao ouvir a sua resposta: "Não quero que tenha outros filhos". Uma das
babas havia contado ao menino sobre a maldição.
Seu segundo
filho, Felix, nasceu em 1887. Em suas memórias, torna-se claro que ele sempre
teve ciúme do irmão mais velho. Mesmo não se parecendo com a mãe fisicamente,
Nikolai era muito próximo dela espiritualmente. Gostava de teatro e música,
pintava quadros. Começou a ganhar fama de escritor. Tudo acabou em 1908, quando
Nikolai apaixonou-se por uma mulher casada, desafiou o marido dela para um
duelo e foi morto poucos meses antes do seu vigésimo sexto aniversário...
Mas vamos
agora novamente dar voz ao príncipe Felix Yusupov, que adorava a mãe.
A mãe era encantadora. Alta, fina, elegante, morena e de cabelos negros, com olhos que brilhavam como estrelas. Inteligente, educada, artística, bondosa. Ninguém conseguia resistir ao seu encanto. Mas ela não se gabava dos seus dotes, e era a própria simplicidade e humildade. "Quanto mais lhes foi dado, - repetia ela para mim e para o irmão, - mais vocês devem aos outros. Sejam humildes. Se estiverem acima dos outros em alguma coisa, Deus os salve de mostrar-lhes isso". Vários nobres europeus, e mesmo membros da realeza, pediam a mão dela, mas ela recusou todos, decidida e encontrar um esposo a seu gosto. O avo sonhava em ver a filha num trono e lamentava a falta de ambições dela. E lamentou também quando soube que ela vai se casar com o conde Elston, simples oficial.
A mãe tinha, por natureza, vocação para dança e teatro, e dançava e representava tão bem quanto as atrizes. No palácio real, num baile em que todos os convidados estavam vestidos com trajes do século 17, o imperador pediu que ela dançasse a moda russa. Ela foi, sem se preparar, mas dançou perfeitamente. Pediram bis cinco vezes.
Stanislavski, ao ver ela num sarau beneficente em "Românticos" de Rostand, chamou ela para atuar, dizendo que o lugar verdadeiro dela era o palco.
Em todos os lugares onde a mãe entrava, ela trazia a luz. Seus olhos brilhavam com bondade e doçura. Ela se vestia com elegância e austeridade. Não gostava de jóias, apesar de possuir as melhores do mundo, e as usava somente em ocasiões especiais.
Quando a tia do rei espanhol infanta Eulália veio para a Rússia, os pais deram um jantar em honra dela em seu palácio em Moscou. A infanta descreve, em suas "Memórias", a impressão causada pela mãe da seguinte forma: "O que mais me impressionou foi a confraternização em minha honra no palácio dos príncipes Yusupov. A princesa era incrivelmente bela, com aquela beleza que é o símbolo da época. Vivia entre quadros, esculturas, em luxuosos recintos em estilo bizantino. Nas janelas do palácio, a cidade sombria e as torres das igrejas. O luxo gritante ao gosto russo se unia com elegância puramente francesa. No jantar, a dona da casa estava em vestido de gala, bordado com diamantes e maravilhosas pérolas orientais. Alta, flexível, com um kokoshnik, ou, como nos dizemos, diadema, na cabeça, também com pérolas e diamantes, só este adereço sozinho é uma fortuna. Jóias incríveis, tesouros do Ocidente e do Oriente, completavam o traje. Com colares de pérolas, pesados braceletes de ouro com ornamentos bizantinos, brincos com turquesa e pérolas, e anéis que brilhavam com todas as cores do arco-íris, a princesa era parecida com uma imperatriz do passado...
Numa outra ocasião, foi o contrário. Os meus pais acompanhavam o príncipe Sergei e a princesa Elisabeth à Inglaterra, para a comemoração do aniversário da rainha Vitória. As jóias eram obrigatórias na corte inglesa. O príncipe aconselhou a minha mãe a levar os melhores diamantes. Um criado que acompanhava os meus pais foi encarregado da maleta laranja de couro. À noite, ao chegar em Windsor, a mãe, vestindo-se para o jantar, mandou a criada trazer anéis e colares. Mas a maleta laranja sumiu. No jantar, a minha mãe estava em vestido de gala, sem uma única jóia. No dia seguinte, a maleta apareceu na bagagem de uma princesa alemã, cujos pertences foram confundidos com os nossos.